Desconto não entra em cálculo de imposto
A legislação determina que descontos condicionados devem entrar na base de cálculo do ICMS.
Laura Ignacio
Prática
comum no setor de telefonia, a venda de aparelho celular com desconto
para fidelização do cliente por determinado período tem gerado autuações
fiscais às companhias no Estado de São Paulo. O Fisco entende que deve
ser recolhido o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS) sobre o valor do desconto oferecido pelas operadoras. Na
discussão, que ainda não chegou ao Judiciário, as empresas obtiveram
recentemente o primeiro precedente favorável na esfera administrativa. O
Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) de São Paulo - última instância
administrativa - livrou uma companhia de pagar multa de mais de R$ 30
milhões.
Em outras manifestações do tribunal administrativo sobre o mesmo
assunto, as autuações foram mantidas. Com a nova decisão, as empresas
que perderam a discussão no passado poderão apresentar recurso no TIT
para que a Câmara Superior pacifique a questão. O que representa uma
oportunidade para os contribuintes reverterem a decisões negativas e
economizarem bilhões de reais.
A legislação determina que descontos condicionados devem entrar
na base de cálculo do ICMS. A prática é comum: a empresa paulista vende
celular com desconto e fornece um plano de telefonia móvel com
diferenciais, como uma tarifa mais barata ou um quantitativo de minutos
maior, com a condição de o cliente firmar uma parceria de longo prazo, a
chamada "fidelidade".
No caso, a companhia telefônica foi autuada porque o Fisco
considera que esse tipo de desconto na venda do aparelho é condicionado a
um evento futuro e incerto (a fidelidade à empresa) que, se não é
cumprido, resulta em multa. O desconto equivaleria ao valor da multa.
Para a advogada Raquel Harumi Iwasi, do escritório Mattos Muriel
Kestener Advogados Associados, que representa a empresa no processo, ao
autuar a companhia, o Fisco misturou a operação de venda do aparelho com
a prestação de serviço de telefonia. "A fidelidade não tem relação com o
aparelho, mas com o serviço. Ambos são negócios jurídicos distintos",
afirma Raquel.
Além disso, a advogada alega que a exigência da multa rescisória é
excepcional. "Geralmente, as pessoas ficam com o plano além do prazo
estipulado e a multa não é cobrada. Assim, não há sentido esse valor
fazer parte da base de cálculo do ICMS", diz Raquel. Para ela, mesmo o
pagamento da multa não configura desconto condicionado. "O valor da
multa não equivale ao valor do desconto porque trata-se de indenização
pela quebra do contrato."
Segundo a Fazenda de São Paulo, a empresa foi autuada porque não
incluiu o valor da multa na base de cálculo do ICMS. O Fisco interpreta
que a fidelidade é condição para a compra com desconto do aparelho e seu
rompimento pode levar a empresa a exigir a restituição do que foi
abatido do preço. "O que seria uma restituição, a companhia de celular
móvel chama, no contrato, de multa", afirma o presidente do Tribunal de
Impostos e Taxas, José Paulo Neves. Para ele, ao ter que pagar a multa, o
consumidor que descumpre a fidelidade acaba perdendo o desconto.
Neves confirma que a discussão sobre o tema deve chegar à Câmara
Superior do TIT. "Por conta desse caso, como já há decisões definitivas
favoráveis à Fazenda, a Câmara deverá pacificar o entendimento do
tribunal", diz o presidente. Para ele, mesmo que a multa seja calculada
de forma proporcional ao período em que o consumidor for fiel, o total
deve ser incluído no cálculo do imposto estadual.
Para o advogado Rafael Fuso, do escritório Salusse Marangoni
Advogados, o julgamento é uma sinalização positiva do TIT. "A decisão é
um precedente até e se houver a sua reforma na Câmara Superior", afirma.
Para ele, a multa jamais poderia compor a base de cálculo do tributo.
"E a multa jamais poderia ser confundida com desconto condicionado,
visto que possuem naturezas jurídicas distintas."
Fonte: Valor Econômico
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